A literatura é apenas a concretude daquilo que está na natureza, nos homens, no mundo. O escritor é apenas um homem que pode, por um acesso de transbordamento exprimir sob uma forma a essência de tudo o que está na vida, de tudo o que pulsa na latência do existir das coisas e dos seres. É assim que sou. Busco na vivência a matéria da minha escrita. Observo o mundo e internalizo dele tudo o que me é possível. Aprendi com um poeta a ver e sentir as coisas assim...
domingo, 2 de dezembro de 2012
Trovas à morena
I
A morena bela-bela
Cujo lábio é de carmim
Dá-me, Deus, casar com ela
Dá-me, Deus, toda pra mim.
II
A morena, a qual eu amo
Nem se lembra do amado
Mas se vou lhe acarinhando
Já pede: - Quero um bocado!
III
Boca linda da morena,
Não me nega de beijar-te
Tem de mim alguma pena
Pois assim meu peito parte.
IV
Em sensuais remelexos,
Vais e deixa-me esquecido
E por ti caem os queixos
Quando o ar sobe o vestido
V
A morena quer caju...
- Sobe tu, mesmo de saia,
Prometo que a ti seguro
Fico de olho, caso tu caias!
VI
A morena, um dia, então,
Vendo que muito penei,
Pôs no seio a minha mão
Pediu beijo e eu beijei.
sexta-feira, 2 de novembro de 2012
A menina e a lua
- Vamos morar na lua?
Pergunta a menina de olhos sapecas e de sorriso fácil
aos homens que passam sisudos naquele fim de tarde crua.
Todos a olham desconfiados da proposta, mas, ágil,
a menina toma os céus com a leveza das aves,
perfila todo o horizonte que era anil,
contorna o sol laranja que descai.
E partiu para a lua!
Gostava de lá porque não havia noites nem dias,
apenas a lua que era toda sua
e as estrelas que eram suas guias.
Amava sujar-se, rolando na poeira lunar,
pegava carona na cauda dos cometas que passavam raspando,
girava em mil cambalhotas sem cansar,
e plantava girândolas nas estrelas, cantando.
Às vezes, porém, lembrava-se cá da Terra,
olhava e via os mesmos homens sisudos.
Apiedava-se deles e pensava: - Quem dera!
Se um dia, ainda, eles viessem morar na lua...
sexta-feira, 3 de agosto de 2012
Palavras? Palavras? Nenhuma? Onde estão, agora que lhes preciso...?
Caros amigos seguidores e leitores casuais de meu blog,
O momento mais feliz para aquele que escreve é o do reconhecimento de seu trabalho, de sua escrita. Vencer o 2º Concurso Literário Pague Menos - Brava Gente Brasileira, foi um passo muito importante para mim. Só em entrar para a coletânea já seria motivo de enorme felicidade, afinal, uma publicação! Mas saber que, dentre tantos belíssimos poemas (já constatei vários lendo o livro), o meu foi aquele que mais agradou ao júri é um motivo pelo qual me permito alguma vaidade neste dia e, por isso, posto o meu poema a seguir. Eu disse alguma vaidade, sim, mas sem nunca perder de vista a simplicidade da vida, da poesia, e por que não, das tantas Marias espelhadas neste poema. Salve! Ave, Ave Marias!
Ladainha - poema vencedor do 2º Concurso Literário Pague Menos, cujo tema foi BRAVA GENTE BRASILEIRA
Ave Maria
que bem cedo se levanta.
Bendita és tu entre as da feira,
bendito é o fruto - e a verdura - que lá vendes.
Santa Maria, mãe de cinco,
que nunca desiste da labuta,
ainda que a vida lhe seja dura.
Ave Maria, levanta a caixa,
tira o legume e arruma a bancada.
Ave Maria, pesa o feijão,
separa-o em quilos e ajusta a balança.
Ave Maria, empilha os fardos,
apronta o caldo e atende o menino;
o dia de hoje é tudo o que tens.
Rogai o impossível pelos teus cinco filhos,
agora e na hora de enquanto viveres.
Santa Maria! Já se vai o sol,
leva pra casa o pão do dia.
Vai bem ligeiro, que a noite é curta.
Ave Maria
que bem cedo se levanta
Bendita és tu entre as da feira
Bendito é o fruto - e a verdura - que lá vendes.
Santa Maria, mãe de cinco...
domingo, 1 de julho de 2012
Pergunta
Haverá, então, um dia,
em que olharemos para trás
e nos perguntaremos o que fizemos de nossas vidas.
Daí, voltaremos nossos olhos um para o outro e sorriremos.
Bastará este sorriso para compreendermos tudo...
sexta-feira, 27 de abril de 2012
a EsCaDa
Chora
de fome e de frio
desce,
sobe e
desce...
E ninguém se compadece
Sua mãe, não conhece. Seu pai, também não.
Cadê seus irmãos? Não tem!
Sobe e
desce,
sobe e
desce...
E agora, moleque (fosse Drummond, diria: E agora, José?)
-
Ninguém me enxerga...
Olha São Francisco! Veja Santa Cecília naquele pedestal!
Olha para ali... olha para acolá...
Mas ninguém olha o menino a agonizar...
Sobe e
desce,sobe e
desce...
Menino abandonado numa beira de escada
Morreu de fome e de frio.
Subiu e
desceu,
subiu e
desceu...
Nem o
vigário nem ninguém o percebeu...
domingo, 22 de abril de 2012
Sentimentos redivivos
Outra vez nós ali.
- o tempo e seu favor prestado aos reencontros –
As feições envelhecidas.
Tu numa fragilidade dócil, sem o vigor
De quando eu, criança, amava-te
no herói que eras para mim.
Hoje sou homem feito, esquecido
mesmo do menino que sorria de ti.
E entre
nós uma longa mesa.
Tão
longa quanto os anos que nos apartaram.A toalha mal-posta ainda repleta de migalhas
do pão amargo do convívio partilhado.
Nossos
olhos vagos, desencontrados,
cruzam-se
num lance breve e sem graça.Profusão de sentimentos incômodos e indistintos
emanam de nossos olhares tão doloridos.
O silêncio penso sobre nós. Nada a dizer.
De
repente, a transposição da longa mesa.
Os
braços se procuram, ainda indecisos e atrapalhados.Então, no desejo recíproco,
um longo e forte abraço....................................................
..........................................................................................
Ouço uma palavra dita
com esforço e soluço.
Eu, lábios trêmulos, entredigo uma profunda resposta
de dor e alívio:
- Meu pai!
A
toalha desliza da mesa
e envolve-se
em si mesmano chão.
sábado, 21 de abril de 2012
Entre o pôr do sol, o beijo dela e a noite, uma pergunta:
Sou tão indigno de tua imensidade.
És quase divina!
Quando volteias em mim teus braços vejo-te magnífica, transcendental.
Mas eu não!
Sou apenas um pobre, reles mortal.
- Por
que me amas, então, por quê?sexta-feira, 20 de abril de 2012
Crônica da caneta
Às
vezes paramos um pouco e começamos
a nos questionar sobre alguns acontecimentos em nossas vidas
Umas vezes chegamos às respostas, outras não
Continua a eterna indagação:
- Por quê?
Aconteceu, por exemplo, comigo, veja-se:
Sim, o prazer era tão grande em tê-la:
seu revestimento maciço, cor de vinho,
detalhes pratas, um pequeno ganchinho na lateral
- era todo um charme este ganchinho -,
apoio emborrachado para os dedos,
ponta precisa, macia,
uma delícia!
Não desgrudava um instante dela,
queria-a para mim, escrevia febrilmente,
às vezes, quando a esquecia em casa,
meu Deus, que tempo que não passava!
Chegava, mal jogava a pasta sobre o birô e lá ela!
Mesmo que naquele dia eu não escrevesse nada,
mas era bom só segurá-la, tê-la!
antes tão firme, desvanecer...
tornou-se rachada,
com espaços em branco na tinta preta que saía da ponta elegante.
Para meu pesar, tudo só piorou:
os espaços aumentaram até sua escrita tornar-se difícil e dura
Não podia mais dar-me o prazer de sua escrita
Não podia mais dialogar comigo
Fechou-se para mim
no seu cantinho de sempre, dentro de um porta-canetas todo aveludado por dentro
e todo talhado por fora
Ela era a única que ocupava aquele depósito
Permanecia lá: intocável, amada, respeitada, idolatrada
não só pelos outros materiais de escritório, como por mim
- aliás, acho que os outros materiais mais tinham inveja que respeito –
Mas eu não: amava-a acima de qualquer outra coisa...
ela voltasse a falar comigo, voltasse a responder aos meus anseios,
que voltasse à minha presença
Mas foram em vão essas tentativas...
- mais que familiar, até -,
era um risco bonito, preciso, macio
era ela, ela!
Sim, ela voltara a viver, era sua mensagem a mim!
Imediatamente tomei-a entre os dedos
e escolhi o melhor papel que havia, o mais branquinho,
cheirando ainda à goma,
e, com o suor na mão, o coração em pulos e os pulsos apoiados na mesa
atritei sua ponta no papel e deslizei com ela...
Mas a escrita estava dura.
Não queria seguir.
Não havia tinta no papel.
A caneta não escrevia.
Desisti, desolado.
Seguiram-se dias e,
vez ou outra,
encontrava um papel riscado
com a mesma tinta,
sempre o mesmo risco.
por algum motivo,
talvez para sempre incompreendido,
ela não queria mais escrever entre meus dedos,
podia viver sem mim,
estava até feliz
- outro dia encontrei uma anedota escrita por ela –
Hoje escrevo no computador
porque é mais impessoal, mais frio,
se eu não gostar, deleto.
Nem ficam marcas ou borradeiras de corretivo.
Mas
ainda hoje me pergunto
- e olha que já faz tempo o episódio da caneta -:
- Por que mesmo?
a nos questionar sobre alguns acontecimentos em nossas vidas
Umas vezes chegamos às respostas, outras não
Continua a eterna indagação:
- Por quê?
Aconteceu, por exemplo, comigo, veja-se:
Certa
vez ganhei uma caneta
Ah,
que delícia!Sim, o prazer era tão grande em tê-la:
seu revestimento maciço, cor de vinho,
detalhes pratas, um pequeno ganchinho na lateral
- era todo um charme este ganchinho -,
apoio emborrachado para os dedos,
ponta precisa, macia,
uma delícia!
Não desgrudava um instante dela,
queria-a para mim, escrevia febrilmente,
às vezes, quando a esquecia em casa,
meu Deus, que tempo que não passava!
Chegava, mal jogava a pasta sobre o birô e lá ela!
Mesmo que naquele dia eu não escrevesse nada,
mas era bom só segurá-la, tê-la!
Mas
o tempo foi passando
e
um dia, senti sua escrita,antes tão firme, desvanecer...
tornou-se rachada,
com espaços em branco na tinta preta que saía da ponta elegante.
Para meu pesar, tudo só piorou:
os espaços aumentaram até sua escrita tornar-se difícil e dura
Não
houve jeito. Sua tinta acabara
Não
podia mais estar comigo como dantesNão podia mais dar-me o prazer de sua escrita
Não podia mais dialogar comigo
Fechou-se para mim
No
entanto, meu amor por aquela caneta
era
tão incomensurável que resolvi mantê-la ali diante de mimno seu cantinho de sempre, dentro de um porta-canetas todo aveludado por dentro
e todo talhado por fora
Ela era a única que ocupava aquele depósito
Permanecia lá: intocável, amada, respeitada, idolatrada
não só pelos outros materiais de escritório, como por mim
- aliás, acho que os outros materiais mais tinham inveja que respeito –
Mas eu não: amava-a acima de qualquer outra coisa...
Por
várias vezes ainda tentei fazê-la riscar:
era
como um desejo de que, numa espécie de milagre,ela voltasse a falar comigo, voltasse a responder aos meus anseios,
que voltasse à minha presença
Mas foram em vão essas tentativas...
Contudo,
certa vez, ao chegar ao escritório,
Percebi
sobre os papeis, um risco familiar,- mais que familiar, até -,
era um risco bonito, preciso, macio
era ela, ela!
Sim, ela voltara a viver, era sua mensagem a mim!
Imediatamente tomei-a entre os dedos
e escolhi o melhor papel que havia, o mais branquinho,
cheirando ainda à goma,
e, com o suor na mão, o coração em pulos e os pulsos apoiados na mesa
atritei sua ponta no papel e deslizei com ela...
Mas a escrita estava dura.
Não queria seguir.
Não havia tinta no papel.
A caneta não escrevia.
Desisti, desolado.
Seguiram-se dias e,
vez ou outra,
encontrava um papel riscado
com a mesma tinta,
sempre o mesmo risco.
Eu
sabia que era ela
E,
com o tempo, compreendi que,por algum motivo,
talvez para sempre incompreendido,
ela não queria mais escrever entre meus dedos,
podia viver sem mim,
estava até feliz
- outro dia encontrei uma anedota escrita por ela –
Só
me restou o questionamento:
-
Por quê?
Depois
tirei a caneta ingrata do portador aveludado
e
juntei-a aos lápis dentro do estojo comum.Hoje escrevo no computador
porque é mais impessoal, mais frio,
se eu não gostar, deleto.
Nem ficam marcas ou borradeiras de corretivo.
Também
evito o contratempo de parar bem no ápice da
[ideia para fazer a ponta do lápis, que quebrou!
[ideia para fazer a ponta do lápis, que quebrou!
- e olha que já faz tempo o episódio da caneta -:
- Por que mesmo?
Poemeto do silêncio
Por que esta guerra silenciosa
Em que há tanto que se diga,
mas finge-se uma mudez insólita,
cruel?
Em que há tanto que se diga,
mas finge-se uma mudez insólita,
cruel?
Navegantes
Ontem,
quando eu me perguntava onde estaríamos,
eu
saberia dizer com precisãoa colina, o vale ou a ilha de nossos sonhos.
Mas hoje o astrolábio de minhas ideias
confunde-se
e me confunde.
Já não sei para onde vamos
Já não sei se quero mais ir.
A última tempestade fragilizara nosso mastro e a vela perdera a virilidade
Talvez consigamos seguir ainda até qualquer terra firme,
Talvez tenhamos que voltar
para de onde um dia partimos
E nesse retorno,
rever a nossa epopéia.
Como num último suspiro diante da morte,
tudo passar por sobre os olhos.
Entretanto, sigamos em frente
ou retornemos caminho,
haverá sempre ao longe, embaçada pelo nevoeiro
no horizonte de nossas vidas
uma grande esfinge
indagando-nos
para sempre os seus mistérios.
Quanto
a nós,
haverá
choro e ranger de dentes.domingo, 15 de abril de 2012
Umas palavras
A
literatura é apenas a concretude daquilo que está na natureza, nos homens, no
mundo. O escritor é apenas um homem que pôde, por um acesso de transbordamento
exprimir sob uma forma a essência de tudo o que está na vida, de tudo o que
pulsa na latência do existir das coisas e dos seres.
É assim que sou. Busco na vivência a matéria da minha escrita. Observo o mundo e internalizo dele tudo o que me é possível. Quando não posso mais conter as dores e as felicidades desse mundo apenas em mim, grito; e este grito é uma palavra, um parágrafo inteiro... ou um poema!
É assim que sou. Busco na vivência a matéria da minha escrita. Observo o mundo e internalizo dele tudo o que me é possível. Quando não posso mais conter as dores e as felicidades desse mundo apenas em mim, grito; e este grito é uma palavra, um parágrafo inteiro... ou um poema!
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